18/05/2008

mula sem cabeça

depois de falar sobre alguns personagens mitológicos do brasil, como o lobisomem, curupira, saci e outros, falamos um pouco sobre a mula sem cabeça. e vem um aluno e me pergunta como era o chifre da mula sem cabeça. peraí, a mula não tem chifre, muito menos a mula sem cabeça. e a classe cai na gargalhada.

17/05/2008

eu me demito

anteontem eu estava subindo para a sala dos professores quando me deparei com uma aluna de nove anos sentada em uma cadeira olhando para a parede, no canto. cheguei perto, ela me olhou e disparou:"eu me demito desta escola".

trabalho?

a classe quieta, todos alunos trabalhando, cada um fazendo seu desenho, uma criança me pergunta, em voz alta: professor, você trabalha?

pizza

classe de primeiro ano do ensino fundamental de uma escola waldorf. no fim do dia, todas crianças já cansadinhas ouvindo uma história, um conto de fadas. aquele clima de magia na classe, fora o calor infernal de fevereiro. eu me desdobrando para contar a história do príncipe que não tinha medo em seu coração e uma criança percebe: "professor, tem uma rodela de suor debaixo do seu braço".

paulo maluf

estou desenhando na lousa, cada criança concentrada em seu caderno fazendo seu desenho. silêncio lindo dentro da classe, daqueles que todo professor gosta. ouço baixinho um aluno saboreando o som das explosivas e fricativas: "paulo maluf". começo a dar uma gargalhada e a classe me pergunta o que foi. não foi nada, digo. e tudo volta ao normal.

o nome do homem

desde os tempos imemoriais do primário, quando ele ainda era primário, não era fundamental, havia um senhor em frente ao meu colégio que vendia balas e sorvetes. desde sempre ele estava ali, com seu carrinho da yopa, quando ainda havia yopa. todos os dias comprávamos besteiras para ruminar nas aulas e tenho certeza de que nunca niguém o chamou pelo nome. poucos ali sequer davam bom dia. resistiu ao escândalo da van mele, que colocava cocaína nos babaloos, resistiu às ameaças de bomba na escola por duas vezes e resistiu à demolição do prédio do colégio. certos de que a demolição do colégio, para dar lugar a um prédio de luxo, faria com que se esquecesse o nome do tio do sorvete, nunca ninguém se importou realmente em saber seu nome.

ontem eu fui à maternidade, para o nascimento do meu segundo filho. estacionei o carro e coloquei um cartão de zona azul. como os exames estavam demorando, gastei todos meus cartões e precisei comprar mais. entrei na banca de jornais e eles haviam se acabado. no café idem. acho que aquele senhor ali da esquina tem, sugeriu a do café.

carrinho de sorvete, nestlé, colete azul e o mesmo sorriso franco sem nome. aproximei-me, pedi o cartão de zona azul e quase fui embora sem me apresentar. não me reconheceu. a barba. peguei o troco e disse que havia estudado na jacurici por doze anos. para onde ele havia se mudado depois da demolição do prédio? fui para o prédio novo, diz ele, bigodes mais brancos. conta que trabalhava ali antes de o prédio ser do pueri domus, quando ainda era liceu eduardo prado. estava ali desde 1959. agora estava de manhã na nova unidade, na rua itacema, pelas manhãs e à tarde marcava ponto em outro colégio, ali perto da maternidade.

quase me despeço, me viro e pergunto seu nome, sem graça, quase me desculpando pelo colégio todo. ele sorriu um sorriso meio de quem não entendeu, pensou bem e respondeu: medeiros.

pego minha zona azul e saio com gosto de colégio na boca mesmo sem ter comprado chiclete.

questão de gosto

bom gosto é relativo.
mal gosto é absoluto.

inocência e malicia

inocência é o que se descobre quando se perde.
malícia é o que se descobre só quando se ganha.

14/05/2008

anjo exterminador

Contei aos alunos ontem a história da libertação do povo judeu do Egito, com as terríveis pragas. Doenças, rios de sangue, rãs por toda parte, nuvens de moscas, mosquitos, gafanhotos, trevas, úlceras pelos corpos dos egípcios, morte dos rebanhos e finalmente o terrível anjo exterminador, encarregado de matar os primogênitos das famílias dos egípcios. Imagens bastante fortes para os alunos de nove anos e para qualquer um. Hoje fomos fazer os desenhos da história e pedi que eles desenhassem cada um uma praga. Não precisa dizer que a maioria optou pelo anjo da morte. Quando estavam todos quietos desenhando, ouço um comentário: olha só meu anjo exterminador tem um gorrinho! E todos caem na gargalhada. Depois da classe recomposta, ouço outro comentário: olha só, o anjo exterminador do Lucas parece uma fadinha cintilante! Outro estrondo de risadas e todos levantando para ver o meigo anjo da morte do Lucas.